Meu
Bebé pequeno e rabino:
Cá
estou em casa, sozinho, salvo o intelectual que está pondo o papel nas paredes
(pudera! havia de ser no tecto ou no chão!); e esse não conta. E, conforme
prometi, vou escrever ao meu Bebezinho para lhe dizer, pelo menos, que ela é
muito má, excepto numa coisa, que é na arte de fingir, em que vejo que é
mestra.
Sabes?
Estou-te escrevendo mas não estou pensando em ti. Estou pensando nas saudades
que tenho do meu tempo da caça aos pombos; e isto é uma coisa, como tu sabes,
com que tu não tens nada…
Foi
agradável hoje o nosso passeio — não foi? Tu estavas bem-disposta, e eu estava bem-disposto,
e o dia estava bem disposto também (O meu amigo, não. A. A. Crosse: está de
saúde — uma libra de saúde por enquanto, o bastante para não estar constipado).
Não
te admires de a minha letra ser um pouco esquisita. Há para isso duas razões. A
primeira é a de este papel (o único acessível agora) ser muito corredio, e a
pena passar por ele muito depressa; a segunda é a de eu ter descoberto aqui em
casa um vinho do Porto esplêndido, de que abri uma garrafa, de que já bebi
metade. A terceira razão é haver só duas razões, e portanto não haver terceira
razão nenhuma. (Álvaro de Campos, engenheiro).
Quando
nos poderemos nós encontrar a sós em qualquer parte, meu amor? Sinto a boca
estranha, sabes, por não ter beijinhos há tanto tempo… Meu Bebé para sentar ao
colo! Meu Bebé para dar dentadas! Meu Bebé para… (e depois o Bebé é mau e
bate-me…) «Corpinho de tentação» te chamei eu; e assim continuarás sendo, mas
longe de mim.
Bebé,
vem cá; vem para o pé do Nininho; vem para os braços do Nininho; põe a tua
boquinha contra a boca do Nininho… Vem… Estou tão só, tão só de beijinhos…
Quem
me dera ter a certeza de tu teres saudades de mim a valer. Ao menos isso era
uma consolação… Mas tu, se calhar, pensas menos em mim que no rapaz do
gargarejo, e no D. A. F. e no guarda-livros da C. D. & C.! Má, má, má, má,
má…!!!!!
Açoites
é que tu precisas.
Adeus;
vou-me deitar dentro de um balde de cabeça para baixo para descansar o
espírito. Assim fazem todos os grandes homens — pelo menos quando têm — 1º
espírito, 2º cabeça, 3º balde onde meter a cabeça.
Um
beijo só durando todo o tempo que ainda o mundo tem que durar, do teu, sempre e
muito teu
Fernando
(Nininho)
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